Literatura Brasileira
Editora: Nova Fronteira
Edição de: 2016
Box Todos os Romances e Contos Consagrados de Machado de Assis
Volume 2: Memórias Póstumas de Brás Cubas / Quincas Borba / Dom Casmurro
10ª leitura de 2021 (11ª resenha do ano)
Sinopse: Os três romances deste volume são considerados as obras-primas de Machado de Assis e representariam a introdução do realismo no Brasil. Desde a dedicatória, que não é escrita pelo autor, mas por um narrador defunto, as Memórias póstumas de Brás Cubas já mostram claros traços de inovação: "Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver dedico como saudosa lembrança estas Memórias póstumas."
Apesar deste segundo volume conter três romances do autor, neste post trarei apenas a resenha de Quincas Borba, pois já fiz as resenhas de Memórias Póstumas de Brás Cubas e Dom Casmurro, livros lidos anteriormente.
Como li Memórias póstumas de Brás Cubas cerca de três anos atrás, não vou me lembrar com detalhes da participação do Quincas Borba no referido livro. Lembro apenas que ele aparece na história e que sua jornada se encerra ali, o que me fez na época acreditar que o livro Quincas Borba se passaria antes da história do Brás Cubas, mas na verdade ambas as histórias acontecem mais ou menos no mesmo tempo e não há a necessidade de ler as duas para compreendê-las. Se o leitor quiser ler apenas este livro aqui não terá nenhuma dificuldade para entendê-lo por não ter lido o outro, vez que não se trata de uma continuação, são histórias independentes.
Eu ainda não sei bem o que sinto por esta história. Dei 4 estrelas por reconhecer o quanto ela foi bem trabalhada pelo autor, que sempre consegue nos envolver em suas tramas e tornar qualquer história irresistível. Quanto mais eu lia mais queria ler, ainda que não estivesse suportando os personagens nem acompanhar o comportamento deles. Mas estou sendo repetitiva, pois vocês já sabem que não costumo simpatizar com os personagens do autor, ainda que ame suas histórias e seja um dos meus autores preferidos da vida. Ele tem a habilidade de criar personagens muito reais, que em sua maioria possuem defeitos que não conseguimos tolerar. É muito fácil odiá-los. Até agora o único livro do autor no qual gostei de mais de um personagem, que eu me lembre, foi Helena, que se tornou a minha história favorita dele.
Em Quincas Borba, temos como protagonista não o personagem que dá título ao livro, mas sim o Rubião, grande amigo do Quincas, e aquele que vai desempenhar o papel de enfermeiro particular nos últimos tempos de vida do filósofo.
Rubião era um professor e vinha de um lar humilde, não conhecendo outra realidade de vida. Ao se tornar amigo do Quincas Borba, um filósofo meio louco, mas muito rico, ele tinha a intenção de ter acesso à fortuna dele através de um casamento do amigo com sua irmã. Acontece que a moça falece antes que ele consiga realizar seu desejo e tudo o que lhe restava para tentar subir um pouco de vida, era seguir sendo um fiel cuidador do filósofo, na esperança de que quando o Quincas falecesse (ele estava muito doente) deixasse alguma coisa para ele, como gratidão por seus cuidados.
E o amigo realmente falece em pouco tempo, deixando não apenas uma parte de sua fortuna como gratidão, mas sim a fortuna inteira. Rubião era o único herdeiro do Quincas e da noite para o dia se torna um homem muito rico. Dividido entre a felicidade e o choque, ele rapidamente faz todo o necessário para colocar as mãos em sua herança, tendo como única condição deixada pelo falecido, que ele cuidasse do cachorro que pertenceu ao amigo, e que levava o mesmo nome do filósofo.
Um tanto desnorteado pela imensa boa sorte, Rubião sai de Minas Gerais para o Rio de Janeiro, pretendendo fixar residência na corte, entre os ricos e privilegiados. Logo conhece Cristiano Palha e sua esposa Sofia, que se tornam seus grandes amigos e guias naquele mundo até então desconhecido. Deslumbrado por aquela nova vida, se torna presa fácil de interesseiros, que se aproximam para obterem uma parte do que ele possuía. Ingênuo demais para reconhecer quem de fato era seu amigo ou não, é muito gentil e mão aberta com todos, gastando bastante e permitindo que fizessem o que bem entendessem em sua casa, acreditando no carinho que diziam sentir por ele.
E no meio de uma situação que qualquer leitor perceberia que não acabaria bem, Rubião ainda se apaixona por Sofia, a esposa de seu amigo e sócio nos negócios. Uma paixão avassaladora, que se torna tudo para ele, que o cega e confunde, e desequilibra por inteiro as suas emoções. Ainda que desejasse ser leal ao Palha, não conseguia evitar aquele sentimento que parecia dominá-lo. E o pior de tudo era não ser correspondido, vez que Sofia tinha planos para sua vida que não incluíam se relacionar amorosamente com um novo rico, que em nada a ajudaria a ascender socialmente.
Qual a possibilidade de toda essa história terminar bem? Nenhuma.rs Mas o Machado de Assis é muito bom em nos surpreender....
Eu esperava um determinado final para este livro. Já dava como certo que sabia como tudo terminaria e foi um grande choque me deparar com um fim tão... inesperado. Não posso falar muito para não dar spoiler, mas digo que se você ainda não leu o livro e resolver dar uma chance sem antes procurar saber todos os spoilers, vai se surpreender bastante. E isso é bom. Eu, particularmente, gosto de ser surpreendida em minhas leituras. Exceto quando é um acontecimento final que não faria sentido, mas no caso deste livro foi um encerramento bastante lógico, embora eu não tenha chegado a cogitar que terminaria assim.
Em nenhum momento gostei do Rubião, por mais que sentisse pena por ele estar tão cercado de gente falsa e interesseira. Ele confiava em pessoas que só queriam o seu dinheiro e não conseguia enxergar isso. No entanto, é um personagem que não me provocou empatia, por conta de seu caráter duvidoso. Ainda assim, reconheço que ele fez algumas coisas muito boas e não era um personagem de todo ruim. Os personagens que eu sim detestei profundamente foram o Palha e sua esposa Sofia. Eram duas pessoas que fariam qualquer coisa para conquistar um elevado status social, para terem poder. Palha é canalha, mas Sofia, a personagem que mais desprezei, é a frieza em forma de gente.
O livro não se resume apenas à história do Rubião, mas possui outras histórias paralelas. É um livro cheio de camadas, que através da filosofia criada pelo Quincas Borba e passada para o Rubião, o tal do Humanitismo, faz uma baita crítica social, sempre cheia daquela ironia elegante do autor. A filosofia em si é bem confusa; defende que não há morte, que tudo acontece de acordo com equilíbrio no universo, que nunca devemos lamentar por quem perde e nem nos sentirmos culpados ao ganharmos, pois aquilo tinha que ser daquele jeito, e se alguém morre é para outra pessoa viver, mas que a pessoa que morreu não morreu de fato. É muito confuso.rs Mas uma coisa que pegamos dessa filosofia é o quanto ela é egoísta e nos faz lembrar daqueles que tudo fazem para serem vencedores, até mesmo pisar ou destruir os "perdedores".
É como se essa filosofia humanitista defendesse que será vencedor o mais forte, o mais esperto, o que não se importa com os outros. E que o perdedor será o mais fraco, devorado pelos espertos. Que "o mundo é dos fortes". Que os fortes não precisam se sentir culpados por tudo o que conquistaram (muitas vezes sem merecer de fato), e que se existem pessoas desprivilegiadas é por serem fracas. Essa filosofia, criada pelo Quincas, é usada pelo autor para fazer uma importante e ferina crítica social ao pensamento vigente em sua época e que, na verdade, ainda é defendido hoje em dia por várias pessoas.
"[...] o homem só comemora e ama o que lhe é aprazível ou vantajoso, e pelo motivo racional de que nenhuma pessoa canoniza uma ação que virtualmente a destrói. Ao vencido, ódio ou compaixão; ao vencedor, as batatas.
- Mas a opinião do exterminado?
- Não há exterminado. Desaparece o fenômeno; a substância é a mesma. Nunca viste ferver água? Hás de lembrar-te que as bolhas fazem-se e desfazem-se de contínuo, e tudo fica na mesma água. Os indivíduos são essas bolhas transitórias."
O mais importante no livro, para mim, é essa filosofia, pois é através dela que tudo se desenrola, embora ela praticamente não volte a ser mencionada na história após a morte do Quincas. Mas em tudo o que se passou, tanto com o Rubião quanto com os personagens secundários, como Dona Tonica e o pai dela, bem como com a Maria Benedita e até com a própria e desprezível Sofia, é clara essa filosofia humanitista em ação. Tudo acontece de acordo com ela e é fácil para o leitor perceber isso. Achei incrível a forma como o autor desenvolveu sua crítica e os acontecimentos do livro. Foi brilhante!
Eu não sei se amo ou detesto este livro.kkkkkkk Mas recomendo muito! Vale a pena a leitura, vale a pena mergulhar no mundo destes personagens tão complexos e acompanhar como cada um terminará na história.
Apesar de amar muito o autor, li este livro recentemente apenas por conta da leitura coletiva promovida pela Isa, do canal Ler Antes de Morrer, senão eu teria lido outros livros do autor antes deste. Eu amo leituras coletivas, pois me incentivam a ler livros que eu talvez demorasse muito para ler se não fosse em conjunto.
Até breve, queridos! :)
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