Título Original: The secret garden
Tradutor: João Sette Camara
Editora: Ciranda Cultural
Edição de: 2019
Páginas: 286
17ª leitura de 2020
Sinopse: Após ficar órfã, Mary Lennox se muda da Índia e vai morar com seu tio viúvo em uma grande casa cheia de segredos na Inglaterra. A mansão tem quase cem quartos e seu tio se mantém trancado lá. Durante a noite, ela ouve o som de choro em um dos longos corredores. Os jardins que cercam a grande propriedade despertam a curiosidade de Mary. Ao decidir explorá-los, a órfã descobre um jardim secreto, cercado por muros e trancado com uma chave perdida. Com a ajuda de dois companheiros inesperados, Mary descobre um caminho e se torna determinada a trazer o jardim de volta à vida.
Está aí uma autora que conseguiu me conquistar com suas belíssimas histórias de amor e superação. E não aquele "amor romântico", mas o amor pela vida, pelos familiares, amigos e por si mesmo. Este ano eu já resenhei A Princesinha, que se tornou um dos meus livros queridinhos, por trazer uma protagonista que apesar de ser apenas uma criança que deveria ser protegida, era mais forte do que eu jamais conseguiria ser (sejamos realistas.rs) e me ensinou muito. A Princesinha é aquele livro que fica no seu coração. É inesquecível. O Jardim Secreto só comprova que a autora realmente tinha o dom de encantar.
No caso do livro anterior, eu já conhecia o filme e ele marcou a minha infância. Quanto ao livro O Jardim Secreto, eu mergulhei no escuro. Porque não tinha assistido o filme e não conhecia nada da história, não sabia o que esperar e todas as surpresas, as descobertas que a Mary fez ao longo da narrativa, eu fiz junto. Tudo era uma surpresa para mim também. Foi mágico acompanhá-la em sua jornada de crescimento, de cura interior. Me senti transportada para dentro daquele jardim, ouvindo os risos das crianças e vendo a vida surgindo como se o mundo estivesse mesmo cheio de mágica. E sabe de uma coisa? Ele realmente está. Existe magia no simples fato de respirarmos. E agora que estamos todos passando por esse período tão sombrio, nunca imaginado, deveríamos valorizar ainda mais o ar que respiramos, o oxigênio que nos mantém vivos. Entender o quanto somos nada diante da Natureza que trabalha incansavelmente para nos dar tudo o que precisamos para viver.
"- Você acredita em Mágica? [...]
- Acredito sim, rapaz - respondeu ela. - Eu nunca a conheci por esse nome, mas que importa o nome? Garanto que a chamam por outro nome na França e por outro nome ainda na Alemanha. [...] Ela não é como nós, pobres-coitados, que nos importamos se somos chamados por outro nome. A Grande Coisa Boa não se preocupa com isso, felizmente. Que o senhor jamais deixe de acreditar na Grande Coisa Boa e de saber que o mundo está repleto dela..."
Mary Lennox, aos dez anos de idade, era a garotinha mais insuportável que qualquer pessoa poderia ter o desprazer de conhecer. Ela não era amada por ninguém e do mesmo modo não sentia amor por coisa alguma, talvez nem por si mesma. Nascida na Índia e negligenciada pelos pais desde bebê, cresceu sem afeto e sem limites. Por vir de uma família importante, todos os empregados eram obrigados a ceder às suas vontades e como ela constantemente era tomada pela fúria e aprendeu que os criados da Índia "não eram pessoas", descontava toda a sua frustração naquele que tivesse o azar de estar por perto. Ninguém nunca a ensinou que era errado xingar e agredir as pessoas simplesmente por elas serem funcionárias de sua família. Ninguém nunca se preocupou em lhe ensinar valor algum.
Quando uma terrível epidemia de cólera dizimou a população da região em que ela morava e os poucos sobreviventes fugiram apavorados, Mary foi esquecida dentro da propriedade. Ela sabia que sua aia naquele dia não iria cuidar dela, pois tinha morrido, mas imaginava que em algum momento alguém se lembraria de aparecer, o que não aconteceu. Muitas horas mais tarde, foi encontrada sozinha ali e recebeu a notícia de que seus pais também tinham falecido. Uma criança normal teria se desesperado, sofrido com a horrível perda, mas Mary... não sentiu nada. Talvez apenas uma certa preocupação em saber quem cuidaria dela.
"As pessoas nunca gostam de mim e eu nunca gosto das pessoas - pensou ela."
Com a morte dos pais, ela foi enviada para a Inglaterra, um país no qual nunca tinha colocado os pés, para morar com um tutor do qual nunca ouviu falar e que não tinha a menor vontade de tê-la sob a sua responsabilidade, vez que já se desgastava o suficiente com suas próprias tristezas. Ali, naquele lugar aparentemente frio e assustador, com tantos quartos nos quais ninguém podia entrar, Mary conheceria um modo diferente de abandono, de solidão. E mais uma vez teria que contar consigo mesma para crescer... Só que talvez, apenas talvez, certa magia a fizesse descobrir um certo jardim tão abandonado quanto ela, no qual parecia que flor alguma poderia nascer... E talvez, apenas talvez, a mesma magia poderia fazê-la conhecer um encantador de animais chamado Dickon e um menininho tão ferido quanto ela chamado Colin. Juntos... eles poderiam trazer o jardim de volta à vida... e cultivar a si mesmos no processo.
"Dez anos era muito tempo, pensou Mary. Ela havia nascido há dez anos."
Quem ler a resenha pode acabar torcendo o nariz para a nossa protagonista mirim, considerando o quanto ela é mimada e desagradável, até mesmo "insensível". Mas garanto que se você der uma chance ao livro será incapaz de sentir um mínimo sequer de desprezo por essa menina. É muito fácil compreendermos que Mary não tinha culpa por ser como era e que tinha um grande potencial, muita luz escondida dentro daquele jardim abandonado que era o seu interior, o seu coraçãozinho. Nenhuma criança pode ser abandonada à própria sorte ou "compensada" com bens materiais, pela negligência dos pais e sua pouca vontade de educá-la. Mary era um estorvo para os pais, que não queriam a responsabilidade que vem quando se coloca um filho no mundo. A menina nunca recebeu um pingo de afeto e reagia de acordo com os "costumes" que via e reproduzia porque as coisas eram daquele jeito. Aprendeu, observando e ouvindo as pessoas "importantes", bem como os próprios criados na Índia, que podia tratar os funcionários como bem entendesse porque eles "não eram pessoas". Mary não inventou nada disso na sua cabeça, apenas copiava o comportamento desprezível dos outros.
"Tinha começado a gostar do jardim assim como começara a gostar do pintarroxo, de Dickon e da mãe de Martha. Também estava começando a gostar de Martha. Aquele parecia um bom número de pessoas para se gostar quando você não estava acostumada a gostar de ninguém."
Ao ser enviada para a Inglaterra, para a propriedade de um tio viúvo que nem sequer queria conhecê-la e tinha dado ordens aos empregados para mantê-la longe dele, Mary poderia ter continuado sem amor e disciplina e se tornado uma adulta egoísta, com traumas de infância e uma total incapacidade de se colocar no lugar do outro. Mas não é isso que acontece. Primeiro, temos a Martha, uma das empregadas da mansão, que é encarregada de "cuidar" de certa forma da menina, levando as refeições dela no quarto. Mary tinha sido avisada que só poderia circular por dois quartos: o de dormir e o de "brincar" (que não tinha nada de criança, claro), mas como não era uma menina acostumada a receber ordens, ela não vai fazer isso. E se por um lado a Martha, uma jovem humilde e muito carinhosa do seu modo, acaba despertando o interesse da menina e a fazendo compreender pouco a pouco que seu comportamento estava "errado", por outro lado, a própria curiosidade da nossa pequena protagonista é o segundo ponto que a faz desabrochar. Porque essa curiosidade irá levá-la a percorrer aqueles corredores sombrios e descobrir segredos que serão essenciais para o seu crescimento. Além, é claro, de ela acabar descobrindo também o tal "jardim secreto", trancado há dez anos, cuja chave fora enterrada e ninguém sabia como encontrar.
"Uma terrível tristeza recaíra sobre ele quando tinha sido feliz e havia permitido que sua alma se preenchesse de trevas, tendo se recusado obstinadamente a permitir que qualquer partícula de luz entrasse ali."
Existem coisas nesta história que são lindas de serem descobertas quando estamos lendo, por isso não irei mencioná-las. É um livro belíssimo, que nos mostra uma espécie de renascimento das três crianças presentes na história (Mary, Dickon e Colin). Na verdade, aqueles que "renascem" são a Mary e o Colin, pois o Dickon, diferentemente deles, tinha uma infância muito saudável, embora fosse bem humilde e nunca tivesse em sua casa o suficiente para alimentar quatorze pessoas (a mãe, a irmã mais velha Martha e as doze crianças da casa). Esse menino possuía muita luz, contagiando qualquer pessoa que estivesse por perto. Ele tem um papel fundamental no desabrochar da Mary e do Colin, na cura interior desses pequenos abandonados e feridos pelos adultos que deveriam protegê-los.
Eu não posso falar muito do Colin, pois na minha opinião, é bem melhor quando o "descobrimos" sem saber muito antes. Mas digo que é um personagem que me deixou com o coração apertado com o sofrimento ao qual foi submetido por tantos anos. E depois ele me encantou com sua força, com sua capacidade para superar, de frustrar os planos daqueles que queriam que ele morresse. Sim, é um choque saber que nessa história existiam pessoas que queriam que um menino de dez anos morresse. Mas a Mary, com sua sabedoria infantil, foi bem clara com o Colin:
"- Se quisessem que eu morresse - asseverou ela. -, aí é que eu não morreria mesmo."
Do jeito dela quis dizer que ele deveria lutar, não permitir que aquelas pessoas vissem justamente o que tanto desejavam que acontecesse. E com sua personalidade forte e a inocência da infância, ela foi tudo o que o Colin precisava para ser uma criança de verdade, para ter a vida que não teve por culpa dos outros. Em muitos momentos, Mary "empurrou" o Colin para a frente, dando o impulso que ele precisava para vencer seus próprios medos.
"Talvez o ponto de partida seja apenas dizer que coisas boas vão acontecer até que elas aconteçam."
É belíssimo acompanhar o crescimento e a superação dessas crianças. Mary não entendia nada de amor. Por nunca ter recebido um pingo de carinho antes, não sabia dar carinho para ninguém. Nunca tinha sentido amor e isso é muito triste. Mas o seu primeiro "despertar", a primeira "pessoa" que ela ama (porque ela o considerava uma pessoa.rs) é um passarinho, gente. Quando aquele passarinho começa a segui-la, como se gostasse dela, Mary sente dentro de si algo que nunca tinha sentido. Uma coisa estranha. E com o tempo ela vai perceber que era amor e assim abrem-se as portas para que ela comece a amar outras pessoas.
"Uma das coisas novas que as pessoas começaram a descobrir no século passado foi que os pensamentos - nada mais do que pensamentos - são tão potentes quanto baterias elétricas e são tão benéficos para as pessoas quanto a luz do sol ou tão nocivos quanto veneno."
É um livro recomendável para todas as idades, mas ainda que a gente sinta um quentinho no coração e a magia da história ao lê-la na infância, somente quando adquirimos certa experiência é que conseguimos compreender os simbolismos presentes no livro e todas as lições que ele pretende ensinar.
Recomendo muitíssimo! É um livro que nos enche de amor, de sonhos, de felicidade num momento em que a ansiedade, a angústia parece querer nos devorar. Ler O Jardim Secreto nos dá esperança que se pensarmos positivo, se tivermos fé e não nos deixarmos abater, se fizermos a nossa parte, tomando todos os cuidados e acreditando em tempos melhores, tudo vai passar. Tudo vai ficar bem.
Este livro já estava nos meus planos de leitura para 2020, mas eu só li agora em abril por conta da leitura coletiva que a Isa propôs aos leitores lá no canal dela, o Ler Antes de Morrer.
Apesar de ter o livro físico, na edição da foto que está no início do post, da editora Ciranda Cultural, e de ser bem bonito, com uma tradução muito boa, a versão que eu li foi da Penguin Companhia. Eu li o e-book que foi disponibilizado gratuitamente pela editora durante as primeiras semanas da quarentena. Essa edição da Penguin possui uma introdução (que só deve ser lida depois que você tiver lido o livro!!! Porque tem spoiler!kkkkk) e um posfácio maravilhosos.
Mesmo tendo lido a versão da Penguin, eu usei o livro físico da Ciranda Cultural para fazer as marcações dos meus trechos preferidos. Assim, todos os trechos que coloquei na resenha são os presentes na edição da Ciranda Cultural.
-> DLL 20: Um livro clássico da literatura
Oii Luna ^^
ResponderExcluirPersonagesns mimadas e arrogantes são irritantes, mas não há nada melhor do que ver essa personagem amadurecer e se tornar uma pessoa melhor, né? Eu ainda não conhecia esse livro, e acho que também não conhecia a autora, mas gostei da sinopse; interessante você mencionar que a menina cresceu sem afeto, dessa forma é até que justificável a maneira como ela se comporta - extremamente triste, devo dizer - gostei bastante da premissa <3
MilkMilks ♥
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Oie, tudo bem? Sou apaixonada por essa edição da Ciranda Cultural. Aqui na minha cidade começaram a fazer aquelas feirinhas de livros por R$ 10,00 e tinham várias opções. Numa das minhas visitas encontrei esse livro. Lembro que faz bastante tempo que assisti o filme junto com minha mãe e é um dos favoritos dela. Faz pouco tempo que descobri que era uma adaptação. Essa edição toda colorida está tão linda. Internamente também com aquelas florzinhas. Comprei e já estou ansiosa pela leitura. Um abraço, Érika =^.^=
ResponderExcluirNossa, já ouvi falar tanto desse livro, mas nunca li. Eu nunca leio essas introduções, muitas delas tem spoiller... Na verdade não leio nada que vem antes do início da história... Isso é típico da penguim, eu tenho 2 livros dele e a introdução tem spoiller. Parece um livro leve, o que seria ideal pra esse momento.
ResponderExcluir;) Nelmaliana Oliveira
Profissão: Leitora
Olá,
ResponderExcluireu já assisti ambas as adaptações, tanto a princesinha como o jardim secreto, e desde que soube que haviam sido inspiradas em livros alimentei o desejo de lê-los, apesar disso ainda não havia procurado as obras de fato e sequer sabia que haviam sido escritas pela mesma pessoa. Lendo sua resenha senti ainda mais vontade de fazer a leitura de ambas histórias, ainda mais ao constatar algumas diferenças pontuais para as histórias que conheço. Amei essa capa, vou procurar adquirir ambos os livros o mais breve possível.
Abraços!