1 de julho de 2019

Contos e Crônicas lidos - Junho/2019

Tempo de leitura:

Em junho eu resolvi começar pelas crônicas. Geralmente leio primeiro contos para só no final do mês ler uma crônica e outra. Mas eu estava com saudades do Caio Fernando Abreu e resolvi mergulhar nas palavras dele no dia 12/06. Sonho com o dia em que terei uma coletânea com todos os contos e crônicas deste autor. Este livro que tenho é muito curto, tem duzentas e poucas páginas, enquanto a obra dele é vasta. 

"Sentado à beira do caminho, o homem cansado ficou quieto, espiando a vida que passava."

Esta foi a primeira crônica que li no mês, intitulada Uma fábula chatinha. Apesar de terminar de uma forma um tanto engraçada, ela me fez refletir bastante sobre a vida, sobre como tudo é fugaz. Vale realmente a pena lê-la. 

E falando em textos que nos fazem refletir, Querem acabar comigo diz tantas verdades que eu fechei o livro e fiquei pensando durante um longo tempo... É isto que tanto aprecio no autor: a capacidade de nos transportar para dentro do texto, para nos conectar e nos fazer pensar em nossas escolhas, nossos erros, nossa realidade... o que permitimos que os outros nos façam. Amo demais os textos dele!


"Hoje estou me permitindo escrever sobre este cansaço indivisível, sobre minha falta de tempo, sobre a desordem que se instaurou em minha vida." [Crônica: Querem Acabar Comigo]

Verão de julho me lembrou imenso o último capítulo da novela Além do Tempo, quando foi compartilhada uma mensagem linda de amor e perdão. Este texto é um pedido por mais amor e menos ódio, por mais simplicidade, mais momentos bons... para que apenas se sinta o prazer da vida e não suas dores. É um texto que me apaixonou! Na verdade, chegou a se tornar minha crônica preferida do autor até agora. Eu queria que, pelo menos, por um verão (ou melhor ainda, por um ano inteiro!) tudo o que é ruim fosse suspenso. Que todos tivessem a oportunidade de serem felizes. Todas as doenças seriam enjauladas, impedidas de afetar qualquer ser humano ou animal. Nenhuma pessoa teria o ódio dentro de si, mas apenas amor e compaixão. 

Ninguém mataria, roubaria, cobiçaria nada de ninguém. Não existiria corrupção ou desemprego. Todos, absolutamente todos, seriam felizes e bons. Livres para terem suas religiões sem precisar atacar a religião dos outros. Nada de direita, centro ou esquerda, mas sim uma união inabalável de seres humanos em busca de um mesmo bem, da felicidade e equidade para todos. Ninguém precisaria ter medo de andar na rua, fosse qual fosse o horário. Nossos filhos estariam sempre seguros na escola, ou no parque, ou na casa de qualquer vizinho. Até mesmo perto de um completo estranho, pois, como eu disse, por um ano inteiro, todas as pessoas seriam boas. Não sentiríamos medo, pois existiria a certeza de estarmos sempre seguros. Seria tão bom, não é mesmo? E quem sabe após o final desse ano tão perfeito as pessoas não acabariam preferindo que os demais anos fossem assim... e se extinguisse para sempre toda forma de maldade, todos os sentimentos ruins. 

Ninguém nunca mais abriria mão da bondade. Ninguém nunca mais se preocuparia com violência e desamor. As únicas preocupações de todos, as únicas manchinhas na felicidade perfeita, seriam as doenças que fazem parte da vida e a morte natural. Mas seria tão grande o privilégio de não mais existirem assassinatos, estupros, corrupção e quaisquer males semelhantes! Que utopia, não é?rs Sabemos que nunca, em nenhum período da História, existiu um mundo assim. E jamais existirá. Esta crônica do autor também não "viaja por este sonho", mas ao mencionar um verão perfeito (em pleno inverno), o Caio Fernando nos faz pensar além das palavras dele. Nos faz desejar ainda mais. Ele queria um verão de coisas boas e sentimentos bons. Eu queria um mundo sem maldade e violência. O que nunca passará de um sonho já que o ser humano provocou um estrago sem retorno neste mundo. E a tendência é que a violência e a maldade aumentem em vez de diminuírem. :( 

Também li outras crônicas do autor, como Que depois de me ler; Carlos chega ao céu; Na terra do coração; De laços, seios, sábados e tormentas; Primeira carta para além do muro

Do Mário de Andrade li apenas duas crônicas este mês: Ensaio de bibliothèque rose (está escrito exatamente assim) e Educai vossos pais. O que posso dizer? Já percebi que não me entendo com a escrita do autor.rs Sim, é minha quarta tentativa de leitura de um texto dele e as coisas não fluem muito bem. É muito mais fácil compreender um romance da Clarice Lispector ou da Hilda Hist (sim, estou exagerando.kkkkkk) do que um texto do Mário de Andrade. Isso vem ocorrendo desde que li Guaxinim do banhado. Vou continuar apostando na escrita dele só porque pretendo futuramente arriscar a leitura de Macunaíma.



- Do meu querido Machado de Assis li cinco contos em junho. 

Ex cathedra é uma história um tanto romântica, que nos deixa com um sorriso no rosto no final. Fulgêncio era um homem completamente obcecado pela leitura e o estudo de tudo. Era formado em Direito, mas lia as mais variadas coisas, de forma excessiva. Passava praticamente vinte e quatro horas de cada dia lendo e estudando, para desespero de sua afilhada, que vivia em sua casa e temia por sua sanidade mental. Segundo a opinião das mucamas da casa, ele já estava um tanto louco. Caetaninha, a afilhada, tentava impedi-lo de ler tanto, mas sem sucesso. Por essa época também, ela já tinha entrado na adolescência e sonhava com uma vida mais movimentada. Foi quando um sobrinho de seu padrinho chegou para viver com eles. O rapaz tinha apenas quinze anos, idade próxima de Caetaninha (que tinha quatorze) e o padrinho da menina resolveu que os dois iriam, futuramente, se casar. Foi uma decisão de seu íntimo, não revelando suas intenções aos dois jovens. Para tanto, temendo que eles acabassem se apaixonando por outras pessoas, decidiu que iria ensiná-los a amar, já que era um intelectual, um estudioso. Então, ele prepara cuidadosamente as aulas e após todos os ensinamentos, seus dois protegidos entenderiam profundamente de amor e ficariam juntos.rs

O caso da vara é um conto que nos mostra como os seres humanos costumam pensar no próprio umbigo... sempre! Damião era um jovem que não desejava ser padre, mas o pai e o padrinho o queriam obrigar a seguir esse caminho, custasse o que custasse. O garoto, então, foge do seminário e vai buscar refúgio junto à Sinhá Rita, uma viúva de grande autoridade, de quem ele pretendia obter compaixão, já que a mulher possuía grande influência sobre o padrinho de Damião. A história se desenrola em torno disso e chegamos até a sentir pena do rapaz, que estava sendo obrigado a ser o que não queria apenas por vontade dos outros. Todavia, quando a história chega ao fim a compaixão que sentíamos se esvai com a atitude dele. Eu fiquei com muita raiva. 

Uma noite é um conto bem triste. O tenente Isidoro, em plena Guerra do Paraguai, conta para seu amigo quais os motivos que o levaram a participar daquela guerra, alegando que não foi nem o patriotismo e nem a ambição, mas sim uma alucinação. Então viajamos junto com suas palavras para conhecer o seu passado e o seu amor por uma jovem chamada Camila. A história dessa moça é perturbadora e o conto acaba de um jeito que nos deixa muito tristes. 

Maria Cora traz a história de um solteirão que considerava quase impossível se apaixonar e muito menos casar. Gostava da vida como ela era... até conhecer uma mulher pela qual ficou fascinado. Acontece que a tal senhora era casada, o que dificultava bastante as coisas, uma vez que ele não imaginava que ela pudesse ser infiel ao marido, embora eles estivessem separados de fato. Mas tão fortes eram seus sentimentos por Maria Cora que ele estava disposto a fazer qualquer coisa para conquistá-la. Este é um dos contos mais longos da coletânea e um dos que menos gostei.rs

Um homem célebre conta a história de um compositor que era muito querido, mas que estava insatisfeito consigo mesmo. Ele só conseguia compor polcas (tipo de música da qual eu nunca tinha ouvido falar) quando na verdade sonhava em ser como os compositores clássicos que tanto admirava. Assim, ele acaba levando uma vida muito triste, estando sempre amargurado, desejando algo que não tinha, em vez de valorizar o talento que possuía e que encantava as pessoas. É aquela coisa de "nunca estamos satisfeitos com o que temos". 

- Do Monteiro Lobato li dois contos. 

Os negros, publicado em 1922, traz uma história trágica, de nos machucar profundamente o coração. Eu tremia enquanto lia este conto, de tão angustiada que fiquei. Mesmo acreditando que as coisas terminariam muito mal não poderia imaginar que seria tão terrível, tão desesperador. Me sinto mal até agora. 

Um jovem português chamado Fernão resolveu tentar a sorte no Brasil e acabou sendo contratado para trabalhar na fazenda do capitão Aleixo, um homem terrível, a quem todos temiam, principalmente os escravos. Ele era dado à crueldade gratuita, sentindo prazer em ver o sofrimento dos outros e torturava os escravos como se fosse a mais incrível diversão. Naquele lugar ninguém se importava se um escravo sofria, exceto a sinhá Izabel, que era uma adolescente de dezesseis anos e que, por não ter o poder de deter a maldade do pai, se trancava no quarto quando os gritos começavam e colocava as mãos no ouvido para tentar não ouvir. É justamente por essa jovem que Fernão se apaixona, mesmo sabendo que o amor era proibido. 

Com a ajuda de Liduína, a escrava escolhida para ser mucama de Izabel e que se torna a melhor amiga da menina, Fernão começa a se encontrar com a jovem, numa felicidade passageira, que faria os três pagarem um alto preço. 

A história começa oitenta anos depois de todo o ocorrido... ficamos sabendo o que se passou com os três personagens (Fernão, Liduína e Izabel) muito tempo depois, quando dois homens, buscando fugir da tempestade, acabam encontrando abrigo na casa de um ex-escravo, Tio Bento, que morava num local muito humilde e onde não caberia os três. Os dois homens, então, resolvem dormir na Casa-grande, mesmo após ouvirem que era mal assombrada e que estava em ruínas. 

"O amor veio vindo e chegou. Chegou e destruiu todas as barreiras. Destruiu nossas vidas e acabou destruindo a fazenda. Estas ruínas, estas corujas, este morcegal, tudo não passa da florescência de um grande amor..."

De todos os contos deste autor, os mais chocantes que li envolvem justamente negros, por isso não entendo por que tem gente que diz que ele era a favor da escravidão quando seus contos expõem de maneira tão brutal a situação terrível em que viviam os escravos, como os "brancos", os "cidadãos de bem" eram cruéis e ainda com a conivência da Igreja e das leis da época. Negrinha escancara isso, Bugio Moqueado nos provoca verdadeiro terror e agora Os negros acaba com nosso coração. Ler os contos do Monteiro Lobato é sofrer muito. Sempre sofro com suas histórias, principalmente com essas que citei. Ele tinha o dom de nos conectar com os personagens, de nos fazer estar na pele deles e sentir todo o desespero. 

Em Os negros a crueldade é mostrada de forma a nos causar um tremendo impacto. Há uma cena em que o demônio do Aleixo (porque era o próprio demônio ou tinha pacto com ele de tão ruim que era esse homem!) para "testar" se um cachorro era mesmo bravo o atiçou contra um escravo e assistiu com prazer enquanto o animal estraçalhava o homem. A pessoa que estava vendendo o animal ficou chocada, então o monstro do Aleixo disse:

"- Ora bolas! Um caco de vida..."

Outras cenas horríveis são narradas. O livro todo nos causa terror e uma dor profunda no coração, por toda a maldade que os escravos suportavam, em como eram convencidos a não se revoltarem, pois eram "predestinados" à dor... Lembro que na época da escola um dos meus professores chegou a falar em detalhes sobre a forma que a própria Igreja "convencia" os escravos de que eles estavam naquela situação por vontade de Deus. E isso é horrível demais para minha cabeça. Em ver como os interesses sempre falaram mais alto que a humanidade. E não devemos nunca esquecer essa parte tão terrível da História do mundo. Do mesmo modo que lemos aos montes sobre Segunda Guerra Mundial e não esquecemos de todas as atrocidades cometidas e os milhões de pessoas que morreram, vítimas dessa guerra, não podemos esquecer também que a escravidão existiu e durou séculos. SÉCULOS. No Brasil terminou apenas em 1888. Há somente 131 anos, só para ressaltar. Pense em como ainda é recente e que todos os três séculos de escravidão no Brasil ainda repercutem nos dias atuais. Antes de considerar a luta de alguém "mimimi" se coloque no lugar do outro, por favor. 

Os pequeninos foi o segundo conto que li do autor no mês de junho. Um homem que já teve terras e uma vida próspera, mas que agora trabalha como carregador, pois perdeu tudo que tinha, conta para seus colegas como um dia foi desgraçado pelas formigas, que o fizeram perder um emprego de confiança e atingiram sua honra, que era o que mais prezava. A história é previsível, mesmo assim acompanhamos a narrativa sem tédio, pois o autor nos fisga e torna tudo interessante. Gostei bastante deste conto. 

Bjs e até breve! :) 



Leitora apaixonada por romances de época, clássicos e thrillers. Mãe da minha eterna princesa Luana e dos meus príncipes Celestino, Felipe e Damon (gatinhos filhos do coração). Filha carinhosa. Irmã dedicada. Amiga para todas as horas. Acredita em Deus. E no poder do amor.

3 comentários:

  1. Oi, Luna.
    Eu lia muitos contos e crônicas quando estava na escola e até gostava muito, mas com o tempo fui deixaando eles de lado para virar uma leitora compulsiva de romances! Rs...
    Tem horas que eu sinto falta de uma história mais curta!
    Vou ficar com esses autores em mente para quando decidir investir nas crônicas novamente!
    Beijos
    Camis - blog Leitora Compulsiva

    ResponderExcluir
  2. Oi Luna!
    Gosto muito de contos e crônicas, apesar de fazer mais de ano que não leio um nacional, preciso remediar isso e com suas dicas ficou mais fácil kkk, parabéns pelas suas leituras e pela sua resenha fiquei empolgada em ler Os negros fiquei curiosa sobre os três personagens e em como termina o desfecho da história. Bjs!

    ResponderExcluir
  3. Olá Luna, tudo bom?
    Toda vez que vejo um dos seus posts sobre contos do Caio Fernando me pego pensando no motivo de não ter iniciado ainda a leitura dos mesmos, tendo em vista que tenho aquela edição com os contos completos dele. Adoro ver a forma como os contos mexem com suas emoções e lhe fazem refletir.
    Quanto ao Monteiro Lobato, ele também é uma incógnita para mim. Seus contos mostram a forma brutal como viviam e eram tratados os escravos e suas declarações iam contrárias a tudo que ele escrevia, tendo indícios fortes de que ele era simpatizante da Ku Klux Klan. Juro que nunca vou entender qual era o real pensamento dele. Enfim! Adorei conhecer um pouco mais dos contos que você leu por esses tempos ♥
    Beijos!

    ResponderExcluir

Seus comentários são sempre bem-vindos! E são muito importantes para o blog!

Topo