Ao ler o título deste conto você provavelmente pensou imediatamente na sereia mais conhecida do mundo! E não é a Iara, claro (apesar de eu amar essa lenda folclórica! Amo folclore!!!)! Estou falando da Ariel, nossa pequena sereia da Disney, tão querida, divertida, bondosa e bela! Que vive grandes aventuras pelo amor do seu príncipe querido e é recompensada ao vê-lo se apaixonar por ela, quebrando o feitiço da bruxa e vivendo felizes para sempre. Ah, que belo conto de fadas! Um dos meus preferidos da infância. Via muitas e muitas vezes. E podia jurar que conhecia de cor e salteado a história. Afinal de contas, eu li o conto quando mais nova. Ledo engano! O que eu tinha lido e não fazia ideia foi a versão romantizada da Disney. Uma versão bem mais leve e com final feliz garantido. Uma versão que não é a verdadeira.
Escrito no século XIX por um dos meus contistas preferidos, A Pequena Sereia está longe de ser aquele tipo de conto que nos deixa com o coração leve e um sorriso sonhador nos lábios. Muito pelo contrário. Terminei a leitura com os olhos cheios de lágrimas, uma raiva intensa e a certeza de que o autor estragou para sempre a lembrança linda que eu tinha da versão da Disney. Se eu decidir ler todas as histórias deste autor, certamente passarei a ver os contos de fadas com outros olhos. :(
Quer conhecer a história original? Eu te contarei, mas saiba que isso significa que a resenha terá spoiler. Fica o aviso!
No fundo do mar, além dos olhos humanos, existe um reino habitado por diversos seres do mar, que vivem suas próprias vidas de maneira semelhante e ao mesmo tempo distinta dos seres humanos. O Rei dos Mares é já um senhor, que há muito tempo ficara viúvo e cuidava das seis filhas com a ajuda de sua mãe, uma sereia majestosa que apesar de amar a vida no mar muito conhecia do mundo dos homens. Um mundo que apresentaria para sua neta mais nova sem ter ideia das escolhas fatais que aquela pequena sonhadora faria. Se soubesse talvez jamais lhe tivesse contado nada. Se soubesse... Talvez a tivesse impedido.
Aos dez anos de idade, a pequena sereia, a mais nova das seis irmãs, era uma menina calada e aparentemente triste que sonhava com o mundo que existia para além das águas do seu reino. Ela desejava intensamente ver as coisas que as outras sereias já tinham tido oportunidade de ver, mas somente quando completasse 15 anos poderia realizar o seu sonho.
O tempo parece não passar, mas quando finalmente o seu dia chega, sua avó a prepara e nossa sereiazinha vai a superfície e seus olhos enxergam pela primeira vez o mundo dos humanos. Aquele mundo que ela tanto tinha desejado. Dividida entre o encantamento e o medo, ela vislumbra um navio próximo onde os marinheiros comemoravam o aniversário de alguém. Logo ela percebe que era um príncipe que estava fazendo aniversário. A criatura mais linda que já vira. Sem saber ao certo o que seu coração sentiu ao vê-lo, ela não consegue retornar para casa. Fica presa a ele, de uma maneira que destruiria toda a sua vida.
Enfeitiçada por sua beleza, seu riso, sua voz... Inicialmente, a sereiazinha fica feliz ao notar a aproximação de uma violenta tempestade, mas logo sua felicidade dá lugar ao medo, porque acaba lembrando-se que os humanos não conseguem respirar debaixo d'água, que se afundasse o seu príncipe morreria. Disposta a fazer o que fosse preciso para salvar sua vida, ela nada ao seu encontro e o resgata da morte. O leva até um mosteiro e fica escondida esperando que alguém o encontre e o leve para dentro. Quando finalmente retorna para o mundo do qual não deveria ter saído, a pequena sereia não consegue se livrar da imagem dele, da dor que sentia no coração. Ela queria fazer parte da sua vida. Queria o seu amor.
Após ouvir uma história, quase uma lenda, contada por sua avó, descobre o que precisava fazer para estar ao lado do seu amor. Ela vai até a bruxa dos mares e sacrificando a sua voz, o dom mais bonito que possuía, passa a ter pernas humanas no lugar da cauda e a oportunidade de poder ir ao mundo dele, de permitir que ele a conheça. Todavia, como diria um certo personagem de Once Upon a Time, toda magia tem um preço. Além de perder a voz, a vida da sereia também corria riscos. Porque se seu príncipe não se apaixonasse por ela, o seu próprio coração pararia de bater e ela morreria.
Apaixonada, acreditando que ele poderia amá-la, ela larga a sua casa, sua família que tanto a queria e vai embora sem olhar para trás. Estava disposta a morrer, se fosse preciso. Porque o que não suportaria seria uma vida sem ele.
"Neste momento passeia de barco, certamente, aquele a quem quero mais do que a minha mãe e a meu pai, aquele que é o meu único pensamento e em cujas mãos deporia o destino da minha vida."
Ela acredita. De todo seu coração. E paga caro demais por isso...
- Esqueçam aquele príncipe apaixonado do filme da Disney. Neste conto, o que vocês conhecem é um homem egoísta, que estava acostumado a ter todas as suas vontades satisfeitas e que quando encontra nossa sereia ingênua caída, a leva para seu palácio, mas não porque se apaixona à primeira vista, mas sim para ter mais uma escrava lhe servindo.
A veste belamente, claro. Ela era sua escrava de luxo. E ele era até bondoso ao ponto de permitir que ela dormisse à porta do seu quarto! Para onde fosse a levava com ele. Ficava fascinado com a sua submissão, com a maneira como ela o idolatrava, mas não passava por sua cabeça amá-la e muito menos casar-se com ela. Gostava dela, a beijava e não pensava em um dia mandá-la para longe, mas era outra que escolheria como esposa. E a mulher que possuía seu coração era aquela que ele acreditava que tinha lhe salvado a vida.
Sem voz por conta da escolha que fizera para estar ao lado dele, a sereia não podia lhe confessar a verdade. Que tinha sido ela quem tinha salvado sua vida. Mas, mesmo que tivesse voz, permaneceria em silêncio, pois nada seria capaz de fazer para aborrecer ou entristecer o homem que amava. Dele suportava tudo, acreditando sempre que em algum momento ele olharia para ela e perceberia que a amava. Nem mesmo quando ele viaja para conhecer sua futura noiva, ela desanima.
- Esta história não termina bem, queridos. Quando o príncipe desgraçado deste conto olha para sua prometida, ele a reconhece como a donzela do mosteiro, a mulher que ele acreditava que tinha lhe salvado. Maravilhado, ele casa-se com ela, feliz da vida, sem nunca sequer pensar naquela que o seguia por todas as partes, que fazia suas vontades, que ele sabia que o amava. Não. Ele ainda quer que ela fique feliz por ele, justamente por amá-lo! Dá ou não dá vontade de matar o miserável?!
Com o coração em pedaços, nossa protagonista se conforma com o seu destino. Porque quando o dia amanhecesse, sua vida terminaria. Sabia o preço que teria que pagar pelo feitiço que a levou até ele. Mas não se arrependia.
Pouco antes do amanhecer, suas irmãs surgem da água, com os lindos cabelos cortados, outro sacrifício de amor. Elas, desesperadas, tinham ido até a bruxa em busca de uma alternativa. Uma maneira de salvar a irmã do seu destino e em troca de uma resposta a bruxa ficou com os cabelos delas. Existia uma forma da sereiazinha livrar-se da morte. Era muito simples (para não dizer todo o contrário): bastava que ela cravasse a faca que a bruxa entregou às suas irmãs no coração do príncipe. Porque quando o sangue dele fosse derramado, ela estaria livre.
- Não é preciso dizer que ela jamais faria algo assim e a bruxa bem sabia disso. Ela sacrifica-se outra vez. E ao amanhecer sua vida termina. Uma vida desperdiçada por um amor que nunca foi correspondido. Por alguém que jamais a mereceu.
Bem... Não há dúvidas que a Ariel teve um destino muito diferente da sereia inocente e cegamente apaixonada que a inspirou.
"A sereiazinha, toda vestida de ouro e prata, segurava a cauda da noiva, mas os seus ouvidos não ouviam a música festiva, os olhos não viam a cerimônia religiosa: pensava apenas na noite da sua morte e em tudo o que havia perdido neste mundo."
- Existem imensas diferenças entre a versão original e a versão "realmente infantil". Há muita dor neste conto aqui. A sereia não perde a voz simplesmente porque a bruxa fez um feitiço e transferiu sua voz para ela. Não. É bem pior que isso. E ao trocar a cauda por pernas, nossa protagonista era obrigada a suportar dores terríveis, como se facas cortassem suas pernas durante todo o tempo. E ela tudo aguentava por amor. É a Amélia do conto de fadas, sem dúvidas.
A situação da nossa altruísta, abnegada mocinha, me fez pensar em tantas e tantas mulheres que largam toda a sua vida por um homem, pelo "seu grande amor". Elas dão às costas para a família, amigos, largam os estudos, o trabalho, tudo por eles. Se apanham suportam, porque não podem estar sem eles, porque acreditam que eles irão mudar e que se batem nelas é porque se importam. Absurdo, não é mesmo? Mas existem muitas mulheres cegas assim. Se eles as traem, elas choram em silêncio porque no fim das contas eles continuam querendo-as, são elas que estão ao seu lado, que vivem com eles. Se voltam para elas é porque as amam. Pelo menos, é nisso que preferem acreditar. Quanto mais eu lia sobre as coisas que a mocinha suportava pelo homem que ela amava, ao ponto de estar disposta a morrer se não tivesse o seu amor, mais chocada eu ficava. Sobretudo porque a história lembra muito a vida real. As mulheres que entregam tudo por homens que não as merecem.
O final do conto não é nada inspirador. Alguns podem dizer que ela teve um final feliz, pois foi presenteada com a POSSIBILIDADE de vir a ter alma dali a trezentos anos depois de morta.kkkkkkkk... Sério, isso parece piada!
Deixa eu explicar para vocês. Segundo o conto, sereias não têm alma. Não importa o quanto sejam boas, quando morrem viram espuma do mar e ponto final. Não existe uma vida depois. Uma alma que sobreviva ao corpo. Mas a sereia desta história desejava muito ter uma alma. Não era justo que os humanos pudessem ter uma vida após a morte e ela não. Então, como recompensa por seu bom coração, ao morrer ela não vira espuma do mar e sim uma Filha do Ar, um tipo de anjo que guarda as crianças. E se ela fizesse bem seu trabalho dali a trezentos anos poderia ir para o céu. Porém, se ela encontrasse crianças malcriadas em seu caminho mais distante se tornaria tal chance.
"Pelo contrário, se se nos depara uma criança malcriada e má, vertemos lágrimas de tristeza e por cada lágrima vertida é aumentado em um dia o nosso tempo de prova."
Aí percebemos que tal final servia para assustar as crianças que ouvissem esse conto e assim elas se comportassem para que as Filhas do Ar pudessem ir logo para o céu e serem felizes. Definitivamente, está aí um conto de fadas que eu jamais contaria para um filho meu ou qualquer outra criança. Que elas mantenham a linda ilusão do conto da Disney. É mais saudável.
Consigo imaginar a sua indignação ao ler esse conto. Fiquei assim também!
ResponderExcluirÉ injusto o que aconteceu com a pequena sereia, ela não merecia este fim.
Decerto, como citado em seu texto, que lembra a história de muitas mulheres que largam suas vidas e tudo que era importante até então, para viver um grande amor e em muitos casos esse "grande amor" não é recíproco e essas mulheres se vêem aprisionada a seguir o seu amado. Acho até que é um dos piores tipos de prisão, da dependência emocional.
Um conto triste e atemporal!
Os tempos mudam, mas as necessidades humanas e seus sentimentos permanecem os mesmos.
Nossa Luna que conto triste, com certeza não vou ler rsrsrs... Não sei oq há de errado com os finais felizes que as pessoas tanto falam, um filme ou série pra ser bom tem que ser triste, trágico ou algo do gênero. Eu adoro finais felizes,tô nem aí rsrsr.
ResponderExcluirOlhe descobri uma série da BBC que infelizmente tem apenas 4 capítulos, mas é linda, pena que deixa um gostinho de quero mais. A série é Norte e Sul já assistiu? Se não ta aí o link: http://www.dailymotion.com/video/xw5md1_norte-e-sul-parte-1-4-legendado-pt_shortfilms
Depois me fala oq achou. Bjos
Olá, Ana! Olá, Vanessa!
ResponderExcluirAna,
Pois é. Ainda estou pensando neste conto. Não gosto de finais assim tão injustos. Ela merecia uma vida diferente, alguém que realmente a amasse. :(
Concordo completamente com o que você disse! Também penso que a pior prisão que existe é a emoção. É quase impossível se libertar.
Vanessa,
kkkkkkkkk... Também prefiro os finais felizes! Existem histórias que terminam mal e por algum motivo se tornam importantes para mim. Titanic é o maior exemplo disso, seguido de perto por O Morro dos Ventos Uivantes. Mas sem sombra de dúvidas prefiro os finais em que os casais ficam juntos, em que encontram a felicidade.
Não acredito, não acredito!!!! Você não faz ideia há quanto tempo desejo assistir essa série!!! Faz muitos anos que ouvi falar dela pela primeira vez. Foi logo depois de criar o blog e até hoje não consegui ver.
Sabia que a série é inspirada no livro de mesmo nome? Quero ler o livro e assistir a série! Devo ver esta semana, se Deus quiser! Muito obrigada!
Oi Luna e eu que fiquei pensando, como assim nunca tinha ouvido falar dessa série e desse livro. Engraçado mas quando assisti lembrei de você, por isso te falei dela. Eu amei a série, mas agora que estou lendo o livro tenho vontade de matar quem a fez, por mudar tantas coisas importantes de livro, fala sério o livro é maravilhoso, quatro capítulos só? ??? Não dá mesmo, mas foi melhor do que não ter nada, pelo menos agora posso ler o livro e ter a imagem de um Mr. Thorton simplesmente perfeito que foi o Richard Armitage, da Margaret e de todos os outros.
ResponderExcluirEstou mais do que louca para assistir, Vanessa! Tentando correr com as obrigações de final de ano (faxina, organizações, etc, etc) para assistir. Quero muito ver antes do final desta semana. Até sábado, no máximo!
ResponderExcluirInfelizmente, eles sempre insistem em mudar cenas, retirar partes nas quais não deveriam mexer. A série que atualmente me irrita por fazer isso é Outlander. Sou completamente apaixonada por essa história, mas a terceira temporada alterou muitas cenas do livro e não estou gostando disso.